Thursday, October 04, 2007

Tipos de Jornalistas

João Paulo Medeiros

Assim como há jornais grandes e pequenos, veículos que sensacionalizam em demasia a notícia e outros que preferem publicá-la com fidelidade ao fato, da mesma forma que jornais diferentes pagam preços díspares pelo trabalho de profissionais que ocupam funções semelhantes, há também diversos tipos de jornalistas.

Os estereótipos que podemos elencar são inúmeros, mas para ser breve tentarei traçar aqui peculiaridades de três identidades que afloram diante do relacionamento com fontes políticas e matérias recomendadas pela empresa.

Estereótipo 1. Começarei pelo tipo que ainda não é maioria, mas está em ascensão dentro das redações: o bajulador.

Esse profissional adora quando é convocado a fazer uma matéria recomendada pela empresa, sobretudo se envolver – como sempre ocorre – fontes da política. Exemplos dessas coberturas são inaugurações, visitas, assinaturas de acordos, coletivas... realizadas por prefeitos, governadores, secretários, etc.

Assim que fica sabendo do evento e mesmo sabendo da intenção da empresa em cobri-lo, faz perguntas óbvias como: “É pra pegar fala com o...?” No evento, faz questão de permanecer o tempo inteiro ao lado do entrevistado e jamais se atreve a fazer uma pergunta que o deixe constrangido ou que remeta a um caso que lhe desagrade.

Na hora de escrever o texto, o lead sempre começa pelo ‘quem’ e em grande parte dos casos o texto é permeado de adjetivações e figuras de linguagem. “O governador assinou ontem o protocolo que salvará milhões de pobres da periferia...”

Resultado: Esses profissionais podem até conquistar espaço dentro das empresas em que trabalham, mas dificilmente recebem a admiração popular, e muito menos das fontes políticas, que os enxergam como meros puxa-sacos.

Estereótipo 2. É maioria dentro das redações: o simples executor de notícias.

Esse tipo permanece constantemente revoltado durante o trabalho e também fora dele. Geralmente tem um senso crítico aguçado e compreende seu papel dentro da sociedade. Assim sendo, percebe que as fontes políticas recomendadas são os principais responsáveis pelo perecimento da cidade, estado ou país. No entanto debelam suas crises de rebeldia e em nome das circunstâncias financeiras (NÃO QUEREM PERDER O EMPREGO) executam as pautas que lhe foram propostas.

Ele detesta coberturas oficiais, mas jamais rejeita ou deixa transparecer para os demais companheiros.

Detalhe: Grande parte deles não consegue subir de cargo dentro das redações, mas nunca renega o que pensam a respeito da política e da subserviência do veículo em que trabalha para com os atores políticos. Vez ou outra consegue ludibriar a editoria e fazer boas matérias, que pelo menos trazem nas entrelinhas informações que denunciam o que realmente deve ser pautado.

Estereótipo 3. São raros, até porque não se mantêm por muito tempo ocupando o espaço das redações e são demitidos: os radicais.

Como disse, constroem pequenas passagens pelas empresas de comunicação. Na primeira cobertura em que ousam iniciar o parágrafo de um modo pouco usual ou se atrevem a fazer uma pergunta embaraçosa à fonte política, recebem duros castigos da editoria.

Na segunda ocasião, estão definitivamente dispensados da empresa.

Nunca abandonam sua formação ideológica, não são afeitos às falsidades e ao luxo do dinheiro adquirido com facilidade. Na grande maioria das vezes encontram emprego noutros órgãos de informação, mas acabam mudando de profissão.

Conclusão: Infelizmente, diante das estreitas relações cultivadas entre os jornais e o jogo político atual, é necessário cada vez mais ter discernimento sobre o verdadeiro papel do jornalista na construção da notícia. Não se pode jamais ter o comportamento de um bajulador, assim como não se deve somente executar a produção noticiosa, ou menos ainda entregar-se à desilusão frente aos obstáculos da profissão.

É preciso, antes de tudo, ter discernimento para compreender o real sentido do ‘ser’ jornalista e abstrair uma pequena faceta de cada tipo profissional, dependendo da situação. É certo que em muitos casos a "ética da barriga" tenderá a impor barreiras à Ética jornalística, mas é dessa luta que o grande profissional se destaca. Para continuar construindo com dignidade notícias que mudem, aos poucos, a vida das pessoas.

Wednesday, October 03, 2007

Para além de um Viaduto

João Paulo Medeiros

A Banca de Jornalistas, boletim diário produzido pela assessoria de imprensa do Governo do Estado, trouxe hoje com euforia o anúncio da inauguração da mais esperada obra do Governador Cássio em seus quase seis anos de mandato: o viaduto de Campina Grande.

“Chegou o dia para encher de orgulho o campinense”, evoca o título maior da publicação, fazendo referência à cerimônia de logo mais à noite.

Mais abaixo, no ‘corpo’ da Banca, prossegue o texto: “Considerada uma ‘belíssima peça de arquitetura’, a obra valoriza a área conhecida como ‘giradouro do cepuc’, interliga as avenidas Manoel Tavares, Jiló Guedes e Floriano Peixoto e corresponde a um investimento de mais de R$ 28,5 milhões na execução dos projetos de construção e de iluminação da área.”

Obviamente que não há a intenção aqui de avaliar a competência ou a viabilidade do material jornalístico veiculado pela assessoria, até porque se deve considerar que o trabalho feito está dentro das atribuições a que se pretende uma assessoria.

Porém, o fato inauguratório e a realidade campinense carecem de algumas observações, que vão de encontro com a estupefação veiculada pelo Governo em torno da obra. A primeira delas é a de que para uma cidade onde a maioria da população vive mal e enfrenta péssimas adversidades sócio-financeiras, certamente é difícil imaginar que a simples edificação de uma “belíssima obra de arquitetura” irá satisfazer as barrigas vazias do município. Depois, seguindo o mesmo raciocínio, é fácil concluir que para uma terra em que muitos ainda andam de carroças a obra terá pouca serventia.

Campina tem hoje um déficit habitacional de cerca de 14 mil moradias, mais de 50 mil indivíduos clamando por um emprego e milhares perambulando pelas ruas em situação deplorável. Aliado a isso, as populações periféricas convivem com o medo da violência e com a falta de vagas em hospitais e postos de saúde. Jovens morrem todos os dias vítimas de latrocínios, facadas e outros delitos nos quatro cantos do município; e têm seus registros policiais complementados com o conforto assegurado por “a polícia fez diligências pelo local mas nada encontrou”.

Apesar de o Governo querer propagar essa idéia, é necessário convir que o viaduto está longe de ser um marco na história da cidade. Campina precisa de obras estruturantes sim: de moradias, hospitais, e outra infinidade de melhorias na urbanização da cidade... No entanto, enquanto isso milhares de cidadãos mendigam por ações imediatas, que valorizem o desenvolvimento e o bem estar social de suas famílias.

Medidas que promovam emprego e renda para a camada mais pobre da sociedade, incentivos e programas que acelerem a implantação e o progresso dos meios produtivos, ações que garantam à classe média campinense o direito de mover a economia da cidade; projetos, enfim, que alcancem uma dimensão maior do que uma mera construção arquitetônica e que poderiam muito bem ser concretizados com os R$ 28,5 milhões de reais empregados num viaduto.

Somente depois disso poderíamos traçar definitivamente um divisor de águas na história da maior cidade do interior do Nordeste. Quando todos tivessem, de verdade, motivos para permanecer cheios de orgulho.